09 janeiro 2014

20 coisas que eu quero que o meu filho
saiba até ao Natal até ao final do ano sempre

#20

Usando a mais simples das metáforas: nem todos os dias são de sol. Mas, recorrendo ainda a uma frase batida, como apreciaríamos os dias de sol se não existissem dias de chuva?

O Tiago culpa sempre o próximo por aquilo que faz de menos certo e lhe custa assumir. Tem 8 anos! O imediatismo do dedo apontado ao do lado seduz qualquer um quando nos sentimos apertados, entre a espada e a parede, entre o medo e a vergonha. Esse plano de fuga toma, então, dimensões gigantes numa criança de 8 anos, resistente às desculpas mas perita em argumentos. Assim, é um cenário da rotina o Tiago apontar-me a mim como culpada dos mais diferentes azares ou contratempos que lhe acontecem a ele, só a ele, fruto do acaso ou de um ato seu, mal calculado.
Quando lhe ouço “a culpa é tua”, dirigido a mim, mesmo quando eu nem ocupava o mesmo espaço físico dele, lembro-me sempre de nós. Nós os adultos, os pais, os maiores, os profissionais, os grandes.

Vivo muito perto de culpas alheias no meu dia-a-dia, para além das que o meu filho me atribui. Vejo episódios desses frequentemente, nos mais distintos contextos, entre gente crescida, supostamente responsável. Assim, e talvez por isso, desculpabilize tanto a culpa que o Tiago vê em mim quando, por exemplo, deixa cair o pacote das bolachas no tapete ou perde um jogo na Xbox. Coloco tal reação ao mesmo nível do ridículo e desvalorizo, depois de lhe tentar ver que foi ele quem tocou no pacote e o fez cair ou que eu nem sei jogar aquele jogo. Ele ainda dirá coisas rebuscadas como eu ter passado e feito vento e daí o pacote ter caído ou, no segundo episódio, eu ter passado frente à televisão e ele assim não ter visto a bola e ter falhado a jogada.

Por outro lado, o poder que os atos dos outros têm no curso dos nossos dias é, muitas vezes, exageradamente empolado. Não só quando eles estão suficientemente próximos para ficarem com culpas nossas. Mas, especialmente, quando permanecem ali, à mão de semear, para justificar o que não somos capazes de conseguir sozinhos. Somos imensamente dependentes dos outros. Vemos tudo o que é nosso à medida do que pertence aos outros. A felicidade que temos ou não. Os bens materiais que temos ou que nos faltam. Os objetivos de vida que alcançamos ou falhamos. Os talentos que somos ou que almejamos.

Eu, que não sou muito de olhar para o lado, que não sobrevivo de comparações ou medições, tenho cada vez mais dificuldade em aceitar que a vida de cada um seja conduzida pela vida do outro do lado. Que os objetivos, as carências, as missões e as vivências de um se transformem em tudo isso porque copiadas de outrem. Que a fonte do que se deseja esteja no que outros querem para si.
Eu, que olho demais para dentro, acho que as culpas, as desculpas, os dias cinzentos, os percalços, começam e acabam em nós, agentes da nossa própria vida, donos e senhores do que desejamos. Só assim podemos, depois, reclamar o que conseguimos como nosso, justificar o alcançado como mérito próprio.
Temos de aprender a ficar com as culpas para, depois, merecermos as bênçãos.

Então, nos dias escuros, impossíveis de contornar, e nos pequenos contratempos, eu quero muito que o Tiago saiba assumir a culpa que tem. Para depois, tudo o que gosta e não gosta venha da cabeça dele e para que tudo o que alcance lhe pertença, por inteiro. Para que ele esteja preparado, no bem e no mal, a depender de si próprio, porque...




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