09 janeiro 2011

"Se sabes o que eu sei, cala-te que eu me calarei"


No dia em que ele lhe contou toda a verdade, Eva jurou que nunca mais iria falar. Simplesmente perdeu as palavras ou prendeu-as mais fundo do que a garganta, mais longe que o coração. Entre o estômago e a razão. Achou ela que ele faria o mesmo. Por muito que falasse, por muito que continuasse a percorrer as mesmas ruas onde passaram abraçados e a rir das mesmas piadas ditas agora a terceiras pessoas.
Havia um espaço reservado onde o mundo não conseguiria entrar. Onde ela, dominando a mente numa luta feroz, também não mais entraria. Vivendo e permanecendo como parte do seu silêncio. De todo e qualquer silêncio. Guardando para si, e escondendo de todos, o que ficava, agora, para trás, como resto de passado ou traço da imaginação. Dali para a frente, ela viveria fechada numa repetição magoada de dias velhos e gastos de tanto os usar, de tanto os repetir substituindo os dias novos que preferia nunca mais ter.
Aquele era o pacto dela com ele. Aquele era o silêncio dela em troca da verdade dele. Aquele era o futuro dela como paga pelo passado com ele.

Como se valesse a pena, como se compensasse tudo. Mesmo as palavras por dizer. Mesmo o silêncio a arranhar a garganta e a pesar nas costas como se fosse um destino.

Encostada ao corrimão da escada, entre os primeiro degraus estreitos e desnivelados depois da porta, Eva escutava conversas alheias, feitas de paredes surdas e demasiado finas para tamanha crueldade. Aquele era o momento depois da despedida, um tempo de tranquilidade depois de batalhas perdidas. E antes de se calar para sempre ela avisou-o...








Nota - 2011 traz ditados e provérbios populares até aqui. Sempre adorei essas frases vindas de todos os pontos do país e do mundo, que com palavras simples ou grandes trocadilhos conseguem dizer, muitas vezes, as mais duras das verdades. E, nestes casos, até as contradições têm encanto. A partir dessas heranças da sabedoria popular surgirão as minhas histórias. Narrativas da imaginação. Ou talvez não.

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