12 maio 2009

Se eu fosse...

...um dia. Era:


"UM DIA ASSIM

Há qualquer coisa de mágico em recordar um dia assim. Talvez por o saber único ou insubstituível. Talvez por ter a certeza que venham quantos filhos vierem nada será como a primeira vez.
Tudo estava combinado com a médica: dia 16 de Agosto de 2005, às 38 semanas de gravidez, iria até à CUF Descobertas, em Lisboa, para saber como se sentia o Tigy dentro da minha barriga.
As malas dentro do carro. Papá ao volante. Mamã a suspeitar que o regresso a casa já seria a três.
No hospital não houve espaço para grandes indecisões: o bebé está pronto para nascer. Toca a instalar no quarto, a trocar a roupa, a deitar na cama, a avisar a família. O Tigy estava mesmo a chegar!
Da entrada no hospital às oito da manhã até às 19h45, quando vislumbrei o meu bebé apesar de encadeada pelos holofotes poderosos da sala, não cheguei a descobrir o que eram, afinal, as tão temidas, as tão faladas, dores de parto. Na verdade, ou o meu corpo não quis reagir à medicação para acelerar as contracções; ou então o meu bebé queria mesmo continuar refugiado dentro de mim por mais uns tempos.
Já o dia me parecia interminável quando ouvi da boca da médica: “Vamos ter de fazer uma cesariana. Num instante vai ver o seu bebé”. E foi mesmo.
No caminho do quarto para a sala de partos não sei se era o pânico ou a ansiedade quem mais me acompanhou, mas levei comigo os olhares excitados de todos os que aguardavam pela chegada do bebé Tigy.
Lembro perfeitamente algumas sensações estranhas da cesariana: a epidural que me foi roubando os movimentos de metade do meu corpo; a descontracção da equipa médica, falando de casas de férias e do jantar dessa noite enquanto mexiam e remexiam na minha barriga; e a força com que arrancaram o bebé de dentro de mim, como se realmente ele estivesse empenhado em não sair dali nunca.
No meio de tanta coisa num só dia talvez tenha custado mais essa estranha sensação de que nos roubam uma parte de nós que não regressará nunca, uma companhia de nove meses, um segredo, um refúgio.
No entanto, e perante tudo o resto, isso é tão pouco. Ganha-se num só dia uma nova vida, uma completa mudança de medos e deslumbramentos. Ali, a meu lado na cama, tinha 3 quilos e 100 gramas de gente em 49 centímetros. Ali, mesmo debaixo do meu braço, estavam escassos minutos de vida numa promessa para a vida inteira.
Do dia em que o meu Tigy nasceu não recordo o pânico do desconhecido; nem sequer penso no pavor às agulhas e aos tubos e a um sem-fim de actos médicos; até já esqueci as dores que descobri quando, horas depois da cesariana, coloquei, pela primeira vez, os pés no chão. Porque do dia em que nasceu o meu filho ficou apenas uma ideia concreta do que é a felicidade, de como ela se pode abraçar e tocar e sentir e conter. Porque no dia em que nasceu o meu filho nasceu também este medo, persistente, de não ser sempre perfeita, de não ser sempre a mãe ideal. E essa é que é uma batalha para a vida, que merece uma entrega sem fim. Por ele."


3 comentários:

scorpiowoman disse...

Quase sem palavras e com as lágrimas a espreitar...
Só tu para escreveres assim e me arrancares de um fôlego o sentir do que nunca vivi.
Beijinhos***

Anónimo disse...

Que texto lindo!!! Imagina que les um texto assim excrito pela tua mae....imagina o Tiago quando o ler...
Beijinhos
Rita R

Catarina Leite Silva disse...

Ler o teu texto fez-me recordar o dia do parto. Embora tenha corrido de forma bem diferente, a verdade é quando eles estão deitados ao nosso lado, o sentimento é igual: a vida muda ... mas para melhor!