
Chegaram depois de mais de duas horas de viagem. As malas não estavam prontas, nem eu. O Tigy ia com os avós, para dois dias de ausência, a mais de 200 quilómetros de mim. O plano estava traçado há várias semanas: nas férias da Páscoa, com a creche fechada e os avós mais libertos, o bebé ia para lá. E foi mesmo.
Aquele momento do carro dos meus pais a afastar-se trouxe-me uma sensação completamente nova. Não sei se de medo, se de perda, se de arrependimento. Os meus pais - as pessoas a quem devo quase tudo, as pessoas em quem mais confio neste mundo - levavam com eles o meu bebé. Portanto, naquele instante, tornaram-se ladrões em fuga com o meu mais precioso bem.
Na sala, com o Beguinho ainda no trabalho, o ambiente estava sinistro e o silêncio doía. Mesmo. Naquele serão, o jantar perdeu o sabor e a programação televisiva o sentido. Abusou-se nos telefonemas e olhou-se pelo canto do olho para os lugares do Tigy – o parque, a cadeira, o cantinho do sofá, mais tarde a cama, a banheira, a casa inteira.
Na viagem sul-norte os papás saudosos tiveram de enfrentar trânsito, calor e a pressa da chegada. Comigo no banco da frente – como há tanto tempo não acontecia – vencemos os quilómetros ao som das canções dos nossos primeiros meses de namoro. Na noite anterior, qual casal solteiro e sem filhos, fomos ao cinema e jantámos uma sandes, numa noite semelhante a tantas do passado.
À chegada, escondido atrás da porta ao colo da avó, o Tigy revelou-se pasmado e o sorriso tímido trouxe, para o meu colo, o meu filho de volta.
Os dois dias com os avós deram-lhe muitos passeios, atenção exclusiva o dia inteiro e um apetite gigante, quase desmedido.
A primeira Páscoa do Tigy, a primeira ausência da minha vista e as grandes vitórias: já não mama, dorme tranquilamente na sua caminha e durante a noite inteira. Graças aos avós ou graças aos papás que o deixaram ir e souberam estar sem ele.