24 fevereiro 2011

Eu hoje respondo assim

Qual é a tua coisa favorita em ti própria? E a que menos gostas?


Falar de mim é o que mais faço nestes Refúgios. Mesmo que, tantas vezes, isso surja disfarçado entre histórias alheias e metáforas rebuscadas. Contudo, quando a questão surge assim, tão direta e tão frontal, as palavras acobardam-se...
Podia dizer que gosto da forma das minhas mãos ou da curva dos meus joelhos. Podia dizer depois que não gosto dos meus pés, porque nem gosto de pés no geral, e dizer também que não gosto da saliência da minha barriga ou dos dias mais endiabrados do meu cabelo. Podia descrever-me assim e deixar por dizer que gosto, cada vez mais, de ser emotiva e transparente e gosto cada vez menos de ser fechada e um bichinho complicado que remói e remói os mesmos pensamentos. Para acabar, ocultava que gostei sempre das minhas certezas inabaláveis capazes de mudar o mundo e sofri sempre com a minha péssima tendência para fazer as opções erradas mesmo que depois, no final do dia ou no final da história, repita: "e não me arrependo de nada".

16 fevereiro 2011

Olha

às vezes dá-me vontade de escrever um cartaz que diga
"Nunca estive tão bem".
Tão em paz,
tão de acordo com o meu corpo,
a minha vontade,
o meu pensamento,
o meu tempo
e o meu espaço.
Nunca estive tão bem quando estou com o Tigy e somos os dois a nunca ter estado tão bem,
nunca estive tão bem sozinha a ver filmes deitada no sofá e a comer pipocas cheias de açúcar,
nunca estive tão bem a passear com os amigos, sem relógio, sem prazos, sem medos.
Só preciso mesmo é que me deixem assim:
a aproveitar sozinha o tão bem que estou.

15 fevereiro 2011

Por acaso

até já me tinha acontecido mas hoje voltou: um sentimento de saudade imensa do Tigy durante todo o dia, como se não o visse há dias ou mesmo semanas. A imagem do preciso instante em que me despedi dele na escola, pela manhã, sempre presente: ele com a bata vestida e o cabelo desalinhado, nas mãos o peluche que hoje levou para mostrar aos amigos e aquele ar perdido que às vezes lhe vejo.

Por acaso é um sentimento angustiante para um dia no trabalho. 
Por acaso já tinha acontecido. Mas aconteceu hoje. 
E não deve ter sido nada por acaso.

14 fevereiro 2011

Uma carta para... #3

A minha Mãe


Mãe,


A idade - a tua e a minha - tem-nos tornado mais amigas e mais parecidas, em tudo o que isso tem de bom e de menos bom, também. Tem-nos feito ver que esta coisa de mãe e filha vai muito além do que uma ensina e a outra aprende, do que uma dá e outra recebe. Esta é uma relação de partilha e de entregas mútuas. E essa tem sido a nossa história ao longo dos trinta anos em que és a minha Mãe. Somos suficientemente iguais para nos compreendermos e suficientemente diferentes para nos admirarmos e os pontos que nos unem são sempre indestrutíveis perante o resto. O resto que é a distância, o tempo, as rotinas, as divergências da vida, as falhas, as decisões, as gerações...
Incrível como me consegues surpreender tantas vezes. Pelas constantes demonstrações de generosidade, pelas batalhas dos outros que assumes como tuas, pela força que, quando era criança, não via em ti e agora invejo e absorvo. O tempo tem-te tornado numa mulher mais completa e mais entregue e eu, enquanto tua filha, só tenho ganho com isso. Pelo exemplo diário de investimento em ti própria, pelo constante passo à frente dado com firmeza mesmo quando parece que já não há caminhos para andar, pela crença vincada que dificuldades podem ser oportunidades e que as mudanças, quando chegam, são sempre para melhor.


As mães são os melhores exemplos, são as melhores conselheiras, são os colos mais seguros que temos. Tu, para mim, tens sido para além disso um espelho de como às maiores provas da vida se deve responder com tenacidade e como quando nada parece faltar há que inventar novos objetivos e novos motivos para avançar.


Muito além das conversas que temos, das opiniões que partilhamos, das histórias de uma e de outra que relatamos, das voltas que damos juntas e dos laços que unimos e apertamos diariamente, mesmo de longe, está um respeito que só tem sentido porque é bilateral: vai de mim para ti, porque és minha Mãe, mas sei e sinto com orgulho, que vai de ti para mim, porque sou tua filha. E o respeito que tenho por ti é feito dessa conquista diária de merecer o orgulho que tens em mim. Apesar de tudo.


Parabéns Mãe.


Da tua filha.

12 fevereiro 2011

Gosto Não Gosto

Gosto de segredos.
Não gosto de portas entreabertas, gavetas mal fechadas, tapetes engelhados, quadros tortos na parede, molduras inclinadas em cima dos móveis, cadeiras afastadas da mesa, ...

11 fevereiro 2011

Desejos


Não foi há muitos anos que ouvi algures essa história que se podem pedir desejos na primeira vez que se come um fruto, em cada ano. Os frutos, como quase tudo, já não têm bem épocas próprias ou tempos definidos para nascerem e morrerem, mas há sabores que só fazem sentido em certos meses do ano... insisto eu.
Esta semana acabou com chuva. Houve até trovoada, som que não ouvia há muito tempo, e os morangos no supermercado surgiram desfasados do estado climatérico de uma sexta-feira como esta. Fiquei a olhar para eles tão grandes e perfeitos, vermelhos e definidos, impecavelmente embalados e com um preço a ignorar. Foi então que me lembrei da história dos desejos e os pus no cesto, entre as porcarias que compro para estes fins de semana só comigo, com a casa em silêncio total, a televisão ligada mas calada, os cobertores no sofá, o computador no colo e sucessivas refeições de comida pré-feita e crepes com chocolate prontos em 3 minutos no micro-ondas.

Entre a fila para pagar, as compras no tapete rolante, os "pip's" sucessivos da rapariga da caixa, as coisas no saco plástico e o caminho para o carro, fui sempre a repetir para mim se devia mesmo ter comprado os morangos: "Ainda nem é primavera", "De certeza que não sabem a nada", "Caros... muito caros...".

Nem todas as sextas-feiras como esta são assim: tão caladas e tão vazias. Com tantas perguntas dentro de outras perguntas. Às vezes o silêncio sabe melhor. Às vezes isto tudo consegue ter mais sentido. Porque nem todas as sextas-feiras aparecem morangos no supermercado. Nem todas as sextas-feiras eu trago para casa um fruto novo para pedir um desejo enquanto lhe lembro o sabor, desde a estação do ano passado.
E, surpreendentemente, nem todas as sextas-feiras fico a olhar para uma embalagem de morangos grandes, perfeitos, vermelhos, embalados, caros, muito caros, pousados no balcão da minha cozinha e lhes pergunto: "E agora, que desejo peço eu?".



07 fevereiro 2011

As perguntas que ele faz
(mas muitas vezes) #11

A pergunta:
Mãe,
achas que uma pessoa pode correr até ao fim do mundo?


A exclamação:
Não há fim do mundo, Tigy.

A certeza:
Há há, Mãe.
Sabes quando a água do rio vai a correr e cai?


O resumo:
Uma cascata?

A conclusão:
Sim sim... isso.
Aí é o fim do mundo.

06 fevereiro 2011

Foi então

que num acto ato convicto, consciente e peremptório perentório, este blogue adoptou adotou o acordo ortográfico.

05 fevereiro 2011

Eu hoje respondo assim*

Qual é a tua palavra favorita e aquela que menos gostas. Porquê?



Há uma palavra que gosto, particularmente: des-lum-bra-men-to. É uma palavra comprida e enrolada, com uma grande dose de emoção, é uma palavra escondida, com duplos significados, daquelas que não mostra à primeira entoação se diz toda a verdade ou toda a mentira. É uma palavra que digo poucas vezes, para não lhe gastar o sentido, e escrevo ainda menos para não lhe quebrar o encanto. É a minha palavra preferida porque guardada, dentro das suas 14 letras e das suas 5 sílabas, fica uma história que se resumiria só com uma palavra assim.

Uma palavra que não gosto? Não gosto de "sucedido" mas também não gosto de "precedido", nem de "superado" ou "extasiado". Mas às vezes digo ou escrevo ou penso... as palavras têm esse poder.








*Há um fenómeno, a que chamam "bloqueio do escritor", que de vez em quando também chega aqui. Quero escrever e falta um tema ou um rastilho que desate as palavras e as faça correr. Dizem que o "bloqueio do escritor" pode ser motivado por cansaço, stress, insegurança, esgotamento criativo... Eu tenho outras explicações, mas encontrei nas perguntas mais originais o incentivo ideal para a perda temporária de habilidade para continuar a escrever, ultrapassando os lapsos da imaginação e da criatividade. Do sentir até.

02 fevereiro 2011

01 fevereiro 2011

As perguntas que ele faz
(mas muitas vezes) #10

A pergunta:
Mãe,
o que achas que é mais importante: o mundo ou os amigos?

A resposta hesitante:
Os amigos?!

A solução:
Não. Eu acho que não.
Amigos temos muitos, mundo é que não temos mais.